Notícias

01.12.2016
Tempo de leitura: 5 minutos

Ceará dá voz a adolescentes em projeto para erradicar o trabalho infantil

“Ser adolescente e não ser revolucionário é um paradoxo”, afirma, convicto, o cearense Felipe Caetano. A entrevista mal começa e já o chamam para um compromisso: ele tem de participar de uma importante reunião. Horas depois, voltamos a conversar.

“Como você vê a adolescência no Brasil? Ao coordenar vários grupos de jovens, suponho que tenha sido um protagonista nesta idade…”, pergunto. “Era, não! Ainda sou. Sou um adolescente, tenho 14 anos. Espero que não esteja falando enganchado”, ri o garoto, surpreendendo a repórter que revisa as anotações – Caetano fala com naturalidade sobre Nelson Mandela e Martin Luther King, por exemplo. Defende propostas ligadas aos direitos humanos como se fosse um militante experiente.

Estudante do 9o  ano do Ensino Fundamental, o jovem é coordenador do Núcleo de Cidadania d@s Adolescentes (NUCA), localizado na praiana cidade de Aquiraz, separada por apenas 36 km de Fortaleza (CE). “Moro em uma região litorânea, e aqui quase todos trabalham vendendo coisas na praia. Isso me incomoda, porque sei que várias dessas crianças e jovens deixam de ir à escola porque precisam trabalhar.”

O entorno também o preocupa. “Quando vou a alguns interiores, pelas estradas vejo crianças com aquele olhar cansado, um olhar triste… por lá, o trabalho chega a ser ainda mais puxado, pois estamos falando do roçado. Parece até coisa de filme, sabe? Várias vezes já tive vontade de pedir para parar o carro e tirar aquela criança dali.”

Crédito: Arquivo pessoal
Por Ana Luísa Vieira, do Promenino, com Cidade Escola Aprendiz

 

Arregaçando as mangas
O cenário e a sensação de que deveria fazer algo para mudar o que via fizeram Caetano bater à porta do Ministério Público do Trabalho. Em um encontro com o procurador Antonio de Oliveira Lima, coordenador do projeto nacional MPT na Escola, também conhecido como Peteca – que leva a questão do trabalho infantil e a difusão do Estatuto da Criança e do Adolescente para escolas das regiões Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste –, propôs um instrumento por meio do qual os adolescentes do Ceará ganharam voz e puderam contribuir no combate ao grave problema, que ainda atinge mais de  3 milhões de meninos e meninas no país. Logo, a parceria foi selada: juntos, criaram o Comitê de Adolescentes na Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Canpeti).

“Felipe se interessou bastante em participar das ações de prevenção e erradicação do trabalho infantil e pediu a parceria do MPT para mobilizar adolescentes dos 184 municípios cearenses por meio do Peteca”, conta o procurador.

Primeiros passos
O I Encontro Estadual de Adolescentes Contra o Trabalho Infantil (Enapeti), que acontece no dia 14 de março em Fortaleza, vai anunciar aos 700 convidados a comissão que acompanhará a iniciativa. Dela, participarão quatro representantes de cada um dos 184 municípios cearenses: “Serão dois adolescentes, observada a paridade de gênero, um representante do Conselho Municipal do Conselho da Criança e do Adolescente e um integrante do Projeto Peteca”, explica Lima. Antes da reunião, em 4 de março, o programa será apresentado aos Coordenadores Municipais do Peteca.

Felipe Caetano aguarda com a ansiedade de menino pelos encontros agendados para este ano, que passarão por municípios como Crateús, Sobral e Itapipoca. Os resultados desta primeira fase de trabalho serão compartilhados na 1ª Conferência Estadual sobre Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil no Ceará, marcada para junho.

Crédito: Arquivo pessoal

Leitura do mundo, leitura da palavra
Como escreveu Paulo Freire (1921-1997), patrono da Educação Brasileira, a leitura do mundo precede a leitura da palavra. Nesse sentido, é necessário conhecer nossos direitos e deveres para colocá-los em prática. O Canpeti é pautado por essa ideia. “Envolver a comunidade e os pais é um dos grandes objetivos”, ressalta Felipe.

Apoiada por atores do Sistema de Garantia de Direitos, a troca de experiências e o aprendizado mútuo entre crianças e comunidades envolvem, essencialmente, os direitos da infância. O Canpeti nasce com o objetivo de conscientizar sobre os riscos do trabalho infantil e a necessidade do trabalho adolescente protegido, que só pode acontecer mediante o cumprimento da Lei de Aprendizagem.

“Os adolescentes participantes serão capacitados para atuar na elaboração de planos de ação, atividades de mobilização, com ações de conscientização da sociedade, principalmente entre seus pares, identificação, busca ativa e denúncia de casos de trabalho infantil, além de monitoramento das políticas de prevenção e erradicação”, complementa o procurador.

Mundo mais justo
Filho da dona de casa Fabiana e do comerciante Francisco, Felipe ficava impressionado quando assistia a reportagens sobre crianças africanas que morrem de fome. “Era bem pequeno, mas saía perguntando: Por que tem tantas pessoas com comida de sobra e deixam estragar? Por que essas crianças passam fome e não vão à escola? Ficava triste, sem respostas”, recorda-se. “Conversava com meus pais sobre a possibilidade de um mundo mais justo. E entendi que precisava colaborar para isso. Que todos precisamos fazer algo. Eles me criaram com muito amor.”

Aprendeu sobre a necessidade de defender o direito à infância com as palestras de Lima, agora seu parceiro de trabalho, e do Nobel da Paz de 2014, Kailash Satyarthi. Já a certeza de que deveria fazer sua parte veio quando conheceu os pensamentos do líder pacifista indiano Mahatma Gandhi (1869-1948). Com o pensador, aprendeu que, se o mundo é bom para as crianças, o mundo é bom para todo mundo.

Assistir Vídeo

Outras Notícias

Informe Social 2024: iniciativas em prol de uma educação pública mais inclusiva e digital

18/06/2025

Informe Social 2024: iniciativas em prol de uma educação pública mais inclusiva e digital

Em 2024, a Fundação Telefônica Vivo reafirmou seu compromisso com a educação pública, promovendo inclusão e inovação nas escolas por meio da tecnologia

Dia dos Voluntários mobiliza 10 mil colaboradores e beneficia 51 instituições em todo o Brasil

18/06/2025

Dia dos Voluntários mobiliza 10 mil colaboradores e beneficia 51 instituições em todo o Brasil

Uma das maiores iniciativas corporativas no país, o Programa de Voluntariado da Fundação Telefônica Vivo mobilizou ações simultâneas em 34 cidades, atendendo cerca de 45 mil pessoas

Especialista explica como a IA generativa pode ser usada na educação

10/06/2025

Especialista explica como a IA generativa pode ser usada na educação

O pesquisador Fábio Campos, do Transformative Learning Technologies Lab, da Universidade de Columbia (EUA), fala dos benefícios e desafios do uso da IA e dá exemplos de como ele pode ser aplicada em sala de aula

Tecnologia em sala de aula: conheça histórias inspiradoras de quatro professores da rede pública

28/05/2025

Tecnologia em sala de aula: conheça histórias inspiradoras de quatro professores da rede pública

Docentes dos estados do Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais e Pará contam como incorporaram ferramentas digitais para tornar os conteúdos educacionais mais atrativos, interativos e dinâmicos

Fundação Telefônica Vivo e MEC: parceria estratégica fortalece formação docente continuada no uso pedagógico das tecnologias digitais 

22/05/2025

Fundação Telefônica Vivo e MEC: parceria estratégica fortalece formação docente continuada no uso pedagógico das tecnologias digitais 

O AVAMEC, plataforma de aprendizado contínuo do Ministério da Educação (MEC), agregou no seu portfólio 24 cursos da Fundação Telefônica Vivo focados no desenvolvimento de competências digitais para docentes e gestores

Piauí investe em Inteligência Artificial (IA) na educação pública e colhe bons resultados

15/05/2025

Piauí investe em Inteligência Artificial (IA) na educação pública e colhe bons resultados

Com aulas de IA, estudantes criam soluções reais para suas comunidades e se destacam em competições nacionais e internacionais