Saltar para o menu de navegação
Saltar para o rodapé
Saltar para os conteúdos
Saltar para o menu de acessibilidade

ARTIGO 208/LIVRO 2 – TEMA: PROFISSIONALIZAÇÃO
Comentário de Adão Bomfim Bezerra
Ministério Público/Goiás

O art. 208 inicia o capítulo que o ECA reserva à “Proteção Judicial os interesses Individuais, Difusos e Coletivos” envolve seis conceitos distintos,assim:
Proteger.- do latim, protegere, composição do prefixo pro (em favor de) e tegere (supino tectum), que significa “cobrir, vestir” (Dicionário Latino- Português,Francisco Torrinha, Porto, Portugal, Ed. Maranus, 1945). O Grande Dicionário Etimológico-Prosódico, de Francisco Silveira Bueno, registra como sinônimos de proteger: amparar, defender, socorrer, beneficiar, apoiar, garantir, cobrir, abrigar e resguardar. Aurélio Buarque de Holanda fornece, ainda, o conceito de “preservar do mal, tomar a defesa e ter a seu cuidado os interesses de alguém” (Novo Dicionário da Língua Portuguesa)
Judicial- diz de efeito que se produz perante o Poder Judiciário,isto
é, a proteção em juízo.
Interesse- palavra de conceito juridicamente definido e que no ordenamento jurídico nacional se entende sempre combinado à idéia de legitimidade, por quanto nenhum interesse pode ser juridicamente protegido sem que se haja por legitimado. O CPC, tratando da espécie, no seu art. 3Q,dispôs que,para propor uma ação, é necessário que se tenha interesse e legitimidade, colocando o interesse como condição sem a qual a pretensão deduzida não se faz exigível. Interesse resulta sendo a relação jurídica de pessoa a bem, como tal estabelecida em lei, que é a fonte primária do direito objetivo, por excelência. E, quando a pretensão à proteção desse interesse é resistida, faz-se presente o interesse à proteção judicial, por meio processual próprio para a solução do conflito resultante de pretensão contrariada.
Existe interesse judicialmente protegível quando, em situação que passa configurar contrariedade, faz cabível providência jurisdicional de modo a que o pedido ao juiz traduza formulação adequada à pretensão resistida, à satisfação do interesse tomado incerto ou desprotegido. O capítulo trata desse interesse na sua feição individual indisponível, difusa e coletiva.
Interesse individual- diz-se daquele que se refere a um só indivíduo e, por isso, sujeito, quase sempre, à manifestação do próprio interessado diretamente em juízo. Os interesses individuais relativos à infância e à adolescência são indisponíveis,por isso compreendidos na esfera de atribuição
Ministério Público, à luz do art. 201, V, do ECA, e – veja-se – com exclusividade, porquanto o ECA, em seu art. 210, ao elencar os legitimados para a ação civil concorrente mente com o Ministério Público, limitou-se às ações fundadas em interesses coletivos e difusos, coerentemente com a linha adotada pela Lei 7.347, de 24.7.85. Isto faz concluir que a única legitimação para a ação civil fundada em direito individual relativo à infância e à juventude é estabelecida com exclusividade para o Ministério Público, ao cotejo da regra de legitimação do art. 210 c/c o art. 201, V,do ECA, consonantemente com o art. 127, caput, da CF, mesmo que a indisponibilidade seja por inferência legal; isto é, se algum interesse relativo à infância e à juventude não for indisponível conceitualmente, sê-lo-á por ficção legal.
Interesse difuso- diz respeito a uma pluralidade de pessoas, sem que uma só delas tenha legitimação para defendê-lo em seu próprio nome. Por natureza, o interesse difuso é imensurável em termos de manifestação de seus destinatários. Não se pode determinar com precisão quais os indivíduos que se encontram concretamente em situação de interesse comum. É o que se dá no art. 220, § 311,lI, da CF quanto à produção e programação das emissoras de rádio e televisão, atendendo aos princípios de preferência e finalidades, promoção da cultura nacional e regional e respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família, consagrados no art. 221 da mesma CF. O interesse difuso, sobre o individual e o coletivo, é o que mais se avulta como interesse público, porque não se contém no universo de um grupo determinado.
Interesse coletivo – a soma de interesses individuais faz o interesse coletivo, o que equivale a poder ser definido em relação a um só indivíduo como em relação a qualquer de seus beneficiários. Contrariamente ao interesse difuso, o interesse coletivo é de possível quantificação quanto a quem o possa invocar individualmente. Antes do advento da Constituição Federal de 1988, o exercício da defesa do interesse coletivo se dava pela ação das várias individualidades a quem assistia.
A representação da coletividade interessada não era legitimada a exercer a proteção do interesse coletivo em juízo, pois quando o fazia representava, isto, sim, os interesses da pessoa jurídica constituída, e não o interesse dos indivíduos por ela congregados.
O direito pós-1988, com o art. 511,LXX, da CF, possibilitou a defesa dos interesses coletivos em mandado de segurança coletivo, por partido político ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados, enquanto já a Lei 7.347, de 24.7.85, destinou a legitimação da ação civil pública, para os casos de responsabilidade por danos causados a qualquer interesse coletivo, ao Ministério Público, concorrentemente com a União, os Estados e Municípios, bem com suas autarquias, empresas públicas, fundações e sociedades de economia mista, além das associações que estejam constituídas há pelo menos um ano e incluam nas suas finalidades a proteção de qualquer interesse difuso e coletivo. Já o ECA, no seu art. 210, restringiu os legitimados, obviamente para os casos de ações cíveis fundadas em interesse coletivo e difuso, concorrentemente com o Ministério Público, excluindo as pessoas jurídicas da Administração indireta do Poder Público autarquias, fundações; empresas públicas e sociedades de economia mista) e incluindo o Distrito Federal e os territórios. As associações legitimadas em matéria de interesse difuso e coletivo relativo à infância e à juventude são aquelas que, além de constituídas há pelo menos um ano, tal como no requisito da lei anterior (n. 7.347/85), também incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Estatuto, observando expressamente a dispensa de autorização da assembléia de associados quando houver expressa disposição estatutária a respeito. Essa consideração já se fazia necessária não porque não fosse intuída do inc. XXI do art. 5Qda CF, mas porque setores mais conservadores do Judiciário- e, por que não dizer, desinformados – vinham desacolhendo a legitimação das entidades associativas quando estas não se apresentavam em juízo com ata de assembléia autorizativa da representação a determinado fim,desprezando a comum disposição estatutária segundo a qual a entidade se acha legitimada à representação de seus associados em juízo e fora dele. Oportuno observar que essa legitimação representativa é admitida também para fins administrativos ou extrajudiciais,nos temos do referenciado inc. XXI.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao enumerar as ações de responsabilidade resultantes do não oferecimento ou da oferta irregular de serviço público necessário ao cumprimento da proteção integral à criança e ao adolescente, fê-lo de formaa enunciativa, exemplificativamente, tanto que o parágrafo único do art. 208 expressamente o diz, ressalvando aquelas hipóteses que não excluem da proteção judicial outros interesses individuais, difusos ou coletivos, próprios da criança e do adolescente, protegidos pela Constituição e pela lei.
Nesse rol de ações visando a outros interesses próprios da criança e adolescente protegidos pela Constituição e pela lei, enumeram-se: ações destinadas a promover reforma em entidades de atendimento à criança e ao adolescente; ações destinadas a promover a construção de casas de abrigo e internação para crianças e adolescentes; ações na área da saúde visando a reformas e ao correto funcionamento de unidades hospitalares’ ações para permitir o acesso de deficientes físicos aos meios de transporte, a estabelecimentos escolares, unidades de lazer etc.; ações para garantir assistência prioritária e integral da gestante ao neonato; ações para garantir exames médicos laboratoriais; de atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade, de ensino noturno regular, de programas suplementares de oferta de material didático-escolar, transporte e assistência à saúde do educando de ensino fundamental; dos serviços de assistência social visando à proteção à família, à maternidade, à infância e à adolescência, bem como ao amparo às crianças e adolescentes que dele necessitam, assim também para escolarização e profissionalização dos adolescentes privados de liberdade, sem prejuízo de outras hipóteses de interesses individuais, difusos ou coletivos próprios da infância e da adolescência protegidos pela Constituição e pela lei, como se viu linhas volvidas. Como se vê, todas as atividades envolvidas no art. 208 são atribuídas aos Municípios, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado ou não, nos termos do art. 30 e seus incs. V, VI e VII da CF.Assim, a questão da legitimação passiva para as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao adolescente, referente ao não oferecimento ou oferta irregular das atividades elencadas no artigo em comento, aponta no sentido do Município.
Este texto faz parte do livro Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, coordenado por Munir Cury

ECA comentado: ARTIGO 208/LIVRO 2 – TEMA: PROFISSIONALIZAÇÃO
ECA comentado: ARTIGO 208/LIVRO 2 – TEMA: PROFISSIONALIZAÇÃO