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*Por Christine Castilho Fontelles

“Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando. Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:  – Me ajuda a olhar!”. Este texto pode ser encontrado no “O livro dos abraços”, de Eduardo Galeano.

Vivemos tempos de profundas perplexidades diante das violências vindas de tantos cantos, seja pelos cuidados não ofertados que custam vidas de pessoas em situação de rua nas frias ruas de Sampa, seja pelos massacres movidos a palavra ou outras armas, como a barbárie contra tribos indígenas no norte do País. Sempre, mas muito mais em tempos assim, é bom beber da fonte de gente como Galeano, como inspiração e como recurso para promover educação para a humanidade.

Segundo o psicanalista Jurandir Freire, “por natureza, o homem não é um ser social. Não existe nele, como nas abelhas e nas formigas, um instinto de preservação da espécie – apenas o de autopreservação. Somos por natureza narcísicos, porque só vemos, prioritariamente, nosso bem-estar individual. O convívio social, e mais ainda o convívio social democrático nos impõem, portanto, um trabalho enorme”. Então, é preciso educar a alma e o olhar, para o que a literatura tende a ser uma grande aliada.

Desde o berço, desde sempre e para sempre, ler com, ler para, ler junto literatura para construir linguagem, proporcionar a experiência de viver em outro tempo e lugar, ser outra pessoa, colocar-se em seu lugar – a isso chamamos alteridade – e revelar afinidades. Ler para indagar, ler para encontrar, ler para sonhar, ler para duvidar, ler para conhecer, ler para se indignar, ler para reconhecer, ler para saber que pertencemos a um mesmo fio da vida. Ler para rir de si mesmo, ler para não claudicar, ler para resistir, ler para se encantar. Ler para aprender a apreciar, tão diferente de tolerar. Ler para compreender que “o equilíbrio da vida depende essencialmente deste bem supremo (o tempo), e quem souber com acerto a quantidade de vagar, ou a de espera, que se deve pôr nas coisas, não corre nunca o risco, ao buscar por elas, de defrontar-se com o que não é”, como escreveu em “Lavoura Arcaica” Raduan Nassar, escritor brasileiro que ganhou recentemente o Prêmio Camões.

A literatura educa para a sensibilidade, companheira e tempero da racionalidade. Em tempos de saúde social tão comprometida, deve-se receitar leituras literárias desde o acordar até o anoitecer. Dispersar literatura pelas redes sociais, não autoajuda, poesia.

E porque amanhã já é futuro, neste site você encontra o que há de melhor em literatura infantil e juvenil, ou melhor, literatura que não tem idade para bem atender à atenção que nos chama Mia Couto: “queixamo-nos de que as pessoas não leem livros. Mas o déficit de leitura é muito mais geral. Não sabemos ler o mundo, não lemos os outros”. Ler pode ser também a forma de mudar para muito melhor o rumo da nossa história. A palavra marca a passagem do imaginário e do simbólico para o real, a partir do que é possível dizer quem somos e em qual mundo queremos viver.

*Christine Castilho Fontelles é cientista social formada pela PUC/SP com MBA em marketing pela FIA/FEA/USP. Consultora de Educação no Instituto Ecofuturo, organização da qual foi co-idealizadora e onde criou e dirigiu o Programa Ler é Preciso por 15 anos. É conselheira do Movimento por um Brasil Literário e da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Fundadora da Centhral do Brasil Consultoria de projetos de educação para a leitura e escrita e sustentabilidade.

Crédito imagem: Shutterstock/Dubova

Ler e Ser: a cultura da literatura contra a cultura da violência
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