Empreender requer uma série de habilidades, que vão desde as técnicas até as socioemocionais. Em um contexto de múltiplas crises, gerir os negócios, focar em um propósito e lidar com as emoções podem ser tarefas ainda mais desafiadoras. Ao mesmo tempo, se renovam a urgência por soluções criativas e maneiras de se reinventar.
“Muitas vezes confundimos a inovação com o ineditismo. Mas o lugar da inovação parte da resolução de problemas e isso é muito potente. A nossa vulnerabilidade, tanto a social quanto a emocional, traz a criatividade como algo exponencial. A gente cria a partir do que nos afeta”, afirmou Ítala Herta, cofundadora do Vale do Dendê e fundadora da DIVER.SSA, durante a live de encerramento da série Conversas que Aproximam.
O último de sete encontros online com foco em educação e empreendedorismo social trouxe como tema Reflexões, tendências e desafios para 2021. E contou também com a participação de Ana Lúcia Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora; Lucas Foster, fundador da ProjectHub e Mabi Elu, coordenadora de projetos da Favelar. A mediação ficou por conta de Fernanda Cabral, realizadora do movimento Imagine2030. Todas as lives estão disponíveis nos perfis do YouTube e do Facebook da Fundação Telefônica Vivo.
Com as profundas desigualdades do país evidenciadas pela pandemia de coronavírus, o empreendedorismo social passou a um lugar central na busca por soluções colaborativas que movimentam, impactam e transformam a vida das pessoas e comunidades.
“Cerca de 90% da nossa estrutura funcionava presencialmente e tivemos de nos reinventar para continuar atendendo as empreendedoras de forma remota. Mesmo assim, nós tivemos as maiores captações de recurso durante a pandemia. Principalmente para projetos de geração de renda, o que é fundamental para a nossa causa pela autonomia financeira para mulheres brasileiras”, acrescentou Ana Lúcia Fontes, da Rede Mulher Empreendedora.
As habilidades socioemocionais e o trabalho em rede
Além da crise sanitária, econômica e social, o mundo se viu diante de um período de risco constante para a saúde mental. E enquanto a demanda por tratamentos sobe, uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde em mais de 130 países mostrou que 93% deles interromperam esse tipo de assistência por causa da pandemia.
“Houve uma mudança na dinâmica das relações e da economia, isso sobrecarregou as instituições e as pessoas. Esses novos hábitos exigem o desenvolvimento de novas habilidades socioemocionais para aprender a lidar com esse período de incertezas. A base da superação do medo é a interação com o outro, com a família e com a comunidade”, afirmou Lucas Foster, que também é psicólogo, além de especialista em economia criativa.
Segundo ele, o maior desafio para transformar a criatividade em uma resposta produtiva para o medo está na relação entre a maturidade e o entusiasmo. Quando não há maturidade a propensão ao erro aumenta, e não saber lidar com a frustração esgota o entusiasmo. Como atingir o equilíbrio? A resposta está no empreendedorismo em rede.
“O jogo entre tentar lidar com as questões práticas de um negócio, com as necessidades do público-alvo e com as nossas próprias vulnerabilidades é decidido na rede. Temos problemas complexos para resolver, que atravessam o empreendimento e vão além dele. Daí vem a importância de acionar parceiros e apoiadores”, complementa Mabi Elu, da Favelar e também fundadora do IFEA, curso de inglês com foco na cultura negra.
4 etapas da criatividade em rede
Conhecimento > A inspiração ajuda os empreendedores a não perderem o entusiasmo inicial. Mentorias, ferramentas e informações relevantes ajudam a transformar o propósito em ação.
Relacionamento > Muitos empreendedores ainda não tem os recursos necessários para colocar as ideias em prática ou alcançar a escala ideal. A conexão entre os parceiros abrem espaços e oportunidades para o negócio.
Reconhecimento > Com as portas abertas é preciso validar o negócio, que passa também por um processo de reconhecimento. É importante que a rede avalie o potencial transformador da proposta e promova essa relevância.
Investimento > É central buscar parceiros que tenham o compromisso de democratizar o acesso a investimentos para alavancar o negócio de impacto com maturidade, entusiasmo e viabilidade.
Reinventando os modelos de negócio
Embora reforce a existência de desafios do empreendedorismo negro e sendo uma mulher em posto de liderança, a engenheira civil Mabi Elu conta sobre a experiência de adaptação e as oportunidades que surgiram para o Favelar, um projeto que realiza reformas e constrói moradias em regiões periféricas do Rio de Janeiro.
“A sociedade passou a olhar com mais atenção para a infraestrutura e insalubridade das casas, o que faz com que a nossa causa ganhe mais voz. Por outro lado, enfrentamos desafios para cuidar da saúde e do bem-estar dos profissionais que trabalham com a gente. Antes da pandemia o foco era executar obras de qualidade, hoje é garantir a segurança das pessoas”, relatou a empreendedora.
Esse movimento de transformar as propostas do modelo de negócios e discutir o que realmente é emergencial também foi observado por Ítala Herta, que acompanhou de perto os negócios acelerados pela Vale do Dendê.
“Durante a pandemia assistimos negócios sociais crescerem, se desenvolverem e tomarem proporções nacionais. Mesmo em um contexto de crise, quando você se propõe a encarar um desafio, as oportunidades são múltiplas. Todo esse processo de regeneração econômica passa pela gente e depende da gente. Quem não olhar pra isso, vai prejudicar a garantia de um futuro sustentável”, concluiu a especialista em inovação social.
O que 2021 reserva para o empreendedorismo?
Uma vez feito um balanço do cenário de 2020 para o empreendedorismo social, os especialistas passaram a debater as tendências para o próximo ano. Entre elas, os destaques apontados foram o modelo híbrido, a transformação a partir da tecnologia, a importância do autocuidado e a continuidade do trabalho em rede.
“A pandemia expôs essas desigualdades e agora as pessoas estão olhando para isso. O que eu quero como cidadã, empreendedora, mãe, professora é que o Brasil aproveite essas novas vozes para construir uma sociedade com mais consciência social, em todos os aspectos e não apenas no ecossistema empreendedor”, finalizou Ana Lúcia Fontes.
Assista na íntegra este último encontro da série Conversas que Aproximam: “Reflexões, tendências e desafios para 2021“:
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