O direito à profissionalização e proteção ao trabalho é um dos estabelecidos pela Lei Federal nº 8.069/1990, que aprovou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Hoje, 25 anos depois, a implementação de políticas e programas que garantem esse direito permanece como desafio. Prova disso são os mais de 3,2 milhões de crianças e adolescentes que continuam trabalhando (PNAD/2013) no Brasil e a baixa adesão de jovens aos programas de aprendizagem profissional.
No conceito, a aprendizagem é um processo de formação técnico-profissional para adolescentes e jovens entre 14 e 24 anos que, por meio de um contrato de aprendizagem, desenvolvem atividades produtivas dentro de uma instituição e/ou empresa, segundo as diretrizes da Lei nº 10.097/2000, assegurando-se ao aprendiz todos os direitos trabalhistas e previdenciários. Essa legislação teve por objetivo produzir as condições objetivas para que políticas e programas públicos viabilizem a inserção qualificada desses segmentos ao mundo do trabalho.
Na prática, o que se observa no cenário atual do emprego juvenil é uma razoável oferta de programas de profissionalização nos distintos níveis de governo e uma reduzida adesão por parte dos jovens a que estes programas se destinam. Por outro lado, o mundo do trabalho, em função da globalização, das inovações tecnológicas e de outros elementos próprios ao quadro econômico contemporâneo, está a exigir um novo perfil do trabalhador jovem.
Exemplo disso se observa nas empresas que ofertam capacitação em serviço, e que exigem dos candidatos o conhecimento prévio de estratégias que permitam a atuação em equipe, gerenciamento de conflitos, capacidade de lidar com novas situações e conhecimentos mínimos de ferramentas operacionais, administrativas e tecnológicas. Entretanto, muitos jovens não compreendem o papel destas ofertas e passam a avaliá-la como um elemento adicional curricular de pouca importância. As famílias, na maioria das vezes, exercem uma pressão para um ingresso imediato no mercado e uma participação no orçamento familiar, sem considerar a importância que essa inserção se efetive de forma qualificada e mais permanente.
Constata-se, por outro lado, que os jovens começam a pertencer paulatinamente ao mundo dos adultos, sem, contudo, haver uma transição formalizada para a inserção em suas novas perspectivas de vida, responsabilidades individuais e coletivas e atuação diante da sociedade. Neste contexto, cabe destacar alguns aspectos levantados pela Agenda Nacional de Trabalho Decente para a Juventude (ANTDJ), em pesquisa de 2011, sobre a situação juvenil. O primeiro deles é que o ingresso no mercado de trabalho é fortemente marcado por desigualdades sociais: mais pobres ingressam mais cedo e em trabalho precário, ou apresentam dificuldades em conciliar trabalho e estudo. Estas questões permanecem como desafios e reforçam a necessidade de se aproximar o diálogo entre gestores públicos, instituições sociais, empresas, famílias e os próprios beneficiários.
O desemprego juvenil, que se distribui desigualmente em função de fatores como classe, gênero e raça é, reconhecidamente, um dos fatores que aumenta a possibilidade da prática precoce de atividades ilícitas e a busca pela informalidade, tendo de ser alvo direto de enfrentamento, principalmente considerando que a maior taxa de desemprego entre os jovens reside naqueles com idade entre 15 e 17 anos. Observa-se, ainda, que jovens provenientes de famílias de baixa renda estão menos qualificados do que os das classes médias para obter acesso a essas oportunidades, devido a fatores como formação educacional precária ou insuficiente, falta de instrumentos de leitura e de uma rede de relações que promova o acesso a um trabalho decente.
Algumas dessas questões encontraram eco no estado do Ceará, a partir de iniciativas do governo estadual, por intermédio da Secretaria de Educação (SEDUC), em parceria com o Instituto Aliança, que desenvolveu uma proposta pedagógica baseada no estímulo a que 45 mil adolescentes e jovens estudantes vinculados a 110 escolas profissionais de tempo integral construam seus planos de vida e de carreira, trabalhando e potencializando as competências socioemocionais e produtivas.
As políticas públicas direcionadas para a juventude têm como missão prevenir e deslocar jovens da marginalidade, eliminando a entrada ou reduzindo a sua permanência nesta condição, sobretudo daqueles em elevado risco social. Na população pertencente a estratos sociais mais vulneráveis da sociedade, especialmente, a oferta de cursos profissionalizantes para alunos oriundos das escolas públicas e com baixo poder aquisitivo deve ter como objetivo reduzir as diferenças de oportunidades de acesso e a sua manutenção no mercado de trabalho.
Nesta perspectiva, a efetiva aplicação da Lei de Aprendizagem, sem dúvida, funcionaria como estratégia assertiva para alcançar esse grupo etário que ainda não encontrou oportunidades educativas para uma inserção qualificada no mundo do trabalho.
*Graça Gadelha é socióloga, especialista na área da Infância e da Juventude e consultora sênior do Instituto Aliança.