Em um país com 210 milhões de habitantes, cerca de 13 milhões deles moram em favelas. Em termos proporcionais, se todas as comunidades juntas formassem um Estado, ele seria o 5° mais populoso do Brasil. Esses dados fazem parte da Pesquisa Favelas Brasileiras, realizada a partir de uma parceria entre o Instituto Data Favela, Locomotiva e a Central Única de Favelas (CUFA).
O levantamento foi feito nos 26 Estados brasileiros, incluindo o Distrito Federal, para medir a configuração geral e atual das grandes comunidades a partir de números. No período de 8 a 18 de dezembro de 2019, foram entrevistadas 2.006 pessoas, de cerca de 63 favelas brasileiras. Os aspectos analisados vão desde concentração de favelas por região até estrutura familiar, organização financeira, consumo, acesso a oportunidades de desenvolvimento, e perspectiva para o futuro.
Em entrevista ao Fantástico, o presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles define a relevância do estudo para a sociedade brasileira: “A favela é o território que muitas vezes é esquecido quando se fala do Brasil. Mas é essa favela que representa uma fatia importante da população brasileira que, cada vez mais, quer ser ouvida e ser protagonista da sua própria história”.
Jovens da periferia: oportunidades distintas
Apesar de 81% das pessoas entrevistadas acreditarem que a vida vai melhorar em 2020, 6 em cada 10 consideram ter menos oportunidades de progredir do que os moradores “do asfalto”, ocupantes dos centros urbanos. Isso acontece porque as condições de desenvolvimento dos jovens da periferia continuam a ser inferiores ao exigido pelo mercado de trabalho.
Como relembra Lucas Lima, 24 anos, nascido e criado no Complexo do Alemão: “Dentro da comunidade existem jovens com uma capacidade criativa acima da média, mas sem acesso a ferramentas para colocar essa mentalidade para fora. Estou tentando trazer recursos para que esses jovens ganhem reconhecimento e construam carreiras. Precisamos trazer a tecnologia para favela para ontem!”.
Lucas criou uma impressora 3D com sucata eletrônica e usa seu produto para investir em projetos educacionais para a comunidade em que cresceu, no Rio de Janeiro.
A trajetória de Vinícius Rodrigues, barbeiro que é referência na região de Guaianases, zona leste de São Paulo, também reforça a importância do empreendedorismo para a comunidade. “Era um momento em que ou eu escolhia isso ou faria uma escolha errada”, conta o jovem.
Depois de trabalhar como garçom, estoquista e chapeiro, finalmente conseguiu dinheiro para abrir sua barbearia e se tornar especialista em cortes chavosos. “Não é só cortar cabelo. Com o trabalho de corte, tem muita coisa relacionada. Servir de exemplo e mostrar que tem outro caminho que dá pra seguir é importante”, afirma.
Celso Athayde acredita que na favela as coisas mudaram e o jovem mudou. “O jovem de favela é ambicioso. Não quer ter patrão ou ter um emprego formal, com pouca perspectiva, o jovem quer sonhar e voar, e sabe que com o próprio negócio, se bem feito, ele tem mais chance de buscar os sonhos dele”, conclui.
Favela feliz, sonhadora e empreendedora
Embora os brasileiros que não moram em favelas reconheçam o senso de comunidade existente dentro das periferias, ainda costumam associar os territórios à pobreza e à violência. Segundo a pesquisa, essa perspectiva muda quando são os próprios moradores a definir a vida nas favelas: alegria, família e amizade. Eles não deixam de citar a pobreza, mas a soma final é positiva. 43% dos entrevistados dão nota 10 para felicidade, ou seja, se consideram felizes.
Além disso, quando perguntados sobre sonhos, o principal é ter a casa própria e 52% dos entrevistados são otimistas em relação à realização de seus objetivos. No que diz respeito ao âmbito profissional, cerca de 4,8 milhões de pessoas querem empreender. Esse número corresponde a 35% da população nas favelas. Desse total, 75% das pessoas estão confiantes de que conseguirão empreender.
“O morador de favela precisa ter consciência da potência que ele tem. Logo, quando ele vê uma pesquisa dessas, que aponta que o sonho de vários moradores de favela é empreender ou que o território que ele mora movimenta, anualmente, R$ 119,8 bilhões, ele vê que não está sozinho e ganha confiança para quebrar paradigmas e realizar sonhos”, diz Celso Athayde, CEO do Grupo Favela Holding e fundador do Data Favela.
O Pense Grande, iniciativa da Fundação Telefônica Vivo, é um programa voltado para o desenvolvimento de jovens que tem interesse em ampliar as oportunidades profissionais a partir do empreendedorismo social.
Desde 2013, quando foi lançado, o Programa já envolveu mais de 50 mil jovens em vários estados brasileiros, compartilhando a metodologia que se baseia no Empreendedorismo, Tecnologia e Comunidade. O objetivo é que os jovens criem e validem novos modelos de negócio inovadores e que seus empreendimentos sejam capazes de gerar impacto social.
Além disso, nos últimos dois anos, o Pense Grande incubou 45 projetos de jovens empreendedores para ajudá-los no processo de tirar as ideias do papel. Esse apoio contribuiu para que as novas soluções da juventude estejam ativas na transformação de suas vidas e das pessoas ao seu redor.