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Difusão da cultura afro-brasileira nas escolas, assessoria jurídica gratuita para mulheres e resgate da ancestralidade empreendedora. Conheça o trabalho de coletivos que trabalham a potência das mulheres negras.

Cerca de 200 milhões de afrodescendentes vivem na América Latina e no Caribe. Em todos os países da região, essa é a população mais afetada pela pobreza, baixa escolaridade e falta de oportunidades. As mulheres negras, em especial, são as que mais sofrem, uma vez que precisam lidar com o racismo e são também vítimas do machismo.

Desde 2014, a legislação brasileira instituiu 25 de julho como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. A data resgata a memória de Tereza de Benguela, que liderou o Quilombo de Quariterê, no Mato Grosso, até ser assassinada em 1770. Ela teve um papel essencial para que o quilombo resistisse contra a escravidão por duas décadas antes de ser destruído pelos colonizadores.

Assim, mais que uma data de comemorativa, o Dia da Mulher Negra Latina e Caribenha, celebrado todo dia 25 de julho, é o reconhecimento da luta diária das mulheres negras. Também é um chamado por um mundo mais solidário, igualitário, diverso e pluricultural. Como diz a filósofa norte-americana Angela Davis: “quando uma mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”.

A seguir, conheça três coletivos de mulheres negras que trabalham pelo empoderamento feminino e pela valorização dos saberes afro-brasileiros.

Coletivo Quilombelas

Quando a ativista e então vereadora do Rio Marielle Franco foi assassinada, em março de 2018, um grupo de seis professoras negras da EMEF Senador Alberto Pasqualini, na zona sul de Porto Alegre (RS), percebeu a urgência de trabalhar história, cultura e identidade dos negros com a comunidade escolar. Nascia assim o Quilombelas.

“Quilombelas porque se a gente quer lutar contra o racismo é preciso, primeiro, se amar e gostar do que você vê quando olha no espelho”, define a arte-educadora Helena Meireles, que integra o coletivo.

As ações do grupo visam fazer valer a Lei 10.639, que desde 2003 torna obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de todo o país. Mas também despertam reflexões sobre outras questões, como machismo e homofobia.

O grupo organiza saraus, oficinas de confecção de turbantes, desfile de roupas para doação e seminários voltados para alunos, professores, funcionários da escola e comunidade.  Os temas discutidos passam por representatividade, lei de cotas, pós-abolição, autodeclaração, políticas públicas voltadas para afro-brasileiros e valores civilizatórios da cultura negra.

“A nossa imagem tem a ver com representatividade. Afinal, somos um grupo de seis mulheres negras em um espaço em que é predominantemente ocupado por pessoas brancas. Isso já gera uma questão de empoderamento e autoaceitação. Começamos a perceber também pela quantidade de cabelos black power que aparecem agora na escola”, afirma Helena.

O grupo é apoiado pela gestão da escola e pela comunidade, que costuma participar ativamente dos eventos promovidos pelo grupo. Aos poucos estão conseguindo ampliar as ações para outras escolas da região, além de criar uma rede de professoras negras que atuam no bairro.

“O coletivo só dá certo porque somos nós falando por nós mesmas”, enfatiza Helena. “Nossa vivência e história está muito ligada à de nossos alunos e dos pais deles. Criamos essa conexão que enriquece o trabalho e dá protagonismo ao nosso povo”.

Mulheres do coletivo feminista Quilombelas estão posando com os punhos levantados indicando força. Acima delas há uma faixa de homenagem por um prêmio conquistado.

Coletivo Feminino Aldeia Itapuã

O bairro de Itapuã, distante 30 km do centro de Salvador, guarda uma história de resistência. Antes dos colonizadores portugueses chegarem, era território dos indígenas Tupinambás. Posteriormente, abrigou um porto clandestino que recebia negros escravizados trazidos da África. Aos poucos, essas populações foram se misturando e ocupando o local.

Trabalhando pelo resgate da história da região, a educadora Rita Capotira percebeu que eram as mulheres do bairro quem mais precisavam de apoio, uma vez que muitas delas tinham dificuldade de reconhecer suas capacidades para batalhar por independência financeira.

Com o objetivo de fomentar o empreendedorismo feminino e a economia solidária, ela criou o Coletivo Feminino Aldeia Itapuã. “As mulheres negras começaram o empreendedorismo no Brasil. Aqui no bairro não foi diferente. Elas que faziam artesanato e quitutes, colocavam a cesta nas costas e saiam para vender no centro. Nós queremos resgatar essa ancestralidade e a força da mulher empreendedora”, diz Rita.

Em parceria com ONGs e instituições, as integrantes do coletivo fazem cursos de capacitação dos mais variados: sobre técnica de vendas e planejamento financeiro a técnica de bordados, moda e estética.

“Nós estamos trabalhando uma construção coletiva de saberes. A ideia é que as próprias meninas troquem conhecimento umas com as outras, assim vamos fortalecendo nossa rede”, continua a educadora Rita.

Uma das maiores ações já realizada pelo coletivo é a Feira das Mulheres de Itapuã, que acontece mensalmente à beira-mar. Além de produtos feitos pelas moradoras do bairro, a feira também traz rodas de conversas, saraus e uma série de atividades culturais com temática escolhida pelo grupo. Em julho, os participantes acompanharam discussões sobre os reflexos do machismo na capoeira.

Rita explica que mais do que fomentar a economia solidária, a feira também trabalha a valorização da cultura da região, uma vez que os produtos vendidos passam por uma pesquisa realizada pelo coletivo.

“Nós fazemos um resgate histórico de artesanato e culinária típicos da nossa região que estavam desaparecendo com o tempo. A nossa feira é de resistência, porque a gente retoma os artefatos, a alimentação e o modo de viver dos nossos antepassados, tudo isso através de ações de empoderamento das mulheres”, explica Rita.

Integrantes do coletivo feminista da Feira das Mulheres de Itapuã estão sorrindo para a câmera. Em primeiro plano, uma mulher de cabelos encaracolados está tirando a selfie e um dos integrantes usa cocar.

TamoJuntas

Em 2016, um movimento de mulheres começou no Facebook a campanha #MaisAmorEntreNós, que visava criar uma corrente de solidariedade entre mulheres. A advogada baiana Laina Crisóstomo participou com a seguinte postagem: “Posso ser advogada voluntária de uma mulher por mês em situação de violência ou que esteja precisando resolver algum problema na Vara da Família”.

O que ela não imaginava é que sua oferta teria 6 mil curtidas e 5 mil compartilhamentos.  Graças à repercussão, ela conheceu mais duas advogadas que tinham o mesmo objetivo: Carolina Rola e Aline Nascimento.

Era o início do TamoJuntas, projeto que presta assessoria multidisciplinar (jurídica, psicológica, social e pedagógica) e totalmente gratuita para mulheres vítimas de violência ou que necessitam de algum auxílio jurídico ou social. Em dois anos de existência, a iniciativa se espalhou por todas as regiões do Brasil e reúne uma equipe de 70 voluntárias.

“Além da assessoria jurídica, cuidamos para que as mulheres consigam ter um retorno à vida, após sofrer com a violência. Na perspectiva jurídica, nossa advocacia é “pro bono” (pelo bem público), e buscamos mulheres que seriam atendidas pela Defensoria Pública, em situação de vulnerabilidade”, disse Laina à Revista Fórum.

Segundo a advogada, a maior parte do público que procura pelo TamoJuntas são jovens negras. Apesar de atender casos variados, ligados a questões familiares e pensão alimentícia, os casos de violência doméstica são os mais presentes.

Três coletivos feministas que representam a luta da mulher negra
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