Funcionários do Grupo Telefônica, brasileiros e estrangeiros, doaram suas férias para vivenciar uma experiência de 10 dias como voluntários em uma comunidade quilombola.
Colaboradores do Grupo Telefônica, brasileiros e estrangeiros, doaram suas férias para vivenciar uma experiência de 10 dias como voluntários em uma comunidade quilombola.
Bastaram poucos dias para que a integração entre voluntários e moradores da comunidade quilombola acontecesse e extrapolasse o trabalho que 18 colaboradores do Grupo Telefônica, sendo 8 brasileiros e 10 estrangeiros, da América Latina e da Europa, se mobilizaram para fazer no Quilombo de Ivaporunduva, no Vale do Ribeira (SP), entre 18 e 29 de julho.
Reunidos pelo projeto Vacaciones Solidárias, que faz parte do Programa de Voluntariado da empresa, cada um dos colaboradores voluntários doou 15 dias de suas férias para viver uma experiência social, que tinha como proposta reformar o Telecentro instalado no Centro Comunitário da comunidade. No entanto, mais que um Telecentro, eles entregaram um Centro Cultural reformado e equipado à disposição da população local e voltaram para casa com muitos aprendizados.
As noites na pousada, embaladas pelo som da moda de viola que os quilombolas e a colaboradora brasileira Vanessa Silva, de 23 anos, conhecida artisticamente como Vanessa Marx, compartilharam ao redor da fogueira, ficaram marcadas na lembrança de seus colegas. Já o peruano Luis Miguel colocou-se pacientemente na lateral do campo de futebol ao fim do primeiro dia de trabalho e foi chamado para se juntar ao time dos quilombolas todas as outras tardes. Estes são dois exemplos da total imersão que o grupo criou ao longo da semana. Apresentamos a seguir algumas histórias de participação para dar a verdadeira dimensão dessa experiência:
Cada minuto importa
Tiago Oliveira Vasconcelos (23 anos, São Luís – MA) teve duas surpresas neste período. A primeira foi a própria admissão no programa: “não fui escolhido de primeira, já achava que não viria, quando recebi um e-mail avisando sobre uma desistência e eu era o próximo da lista de espera…” Para ele, voluntariado não é trabalho, mas uma chance de experimentar outras realidades. O que não exclui o sentido de desafio. “Além de desenvolver o projeto, temos que lidar com o tempo deles. Claro, estamos no seu ambiente”, refletiu Tiago, que representou o grupo de voluntários em uma reunião com as lideranças da comunidade para alinhar expectativas com o processo já avançado. Sentados nos bancos da igreja, conversaram sobre a necessidade de a comunidade se aproximar do grupo, “não para ajudar no trabalho, mas para se integrar”, explicou o voluntário. E então teve uma segunda surpresa: “eles foram muito receptivos às nossas críticas e receberam tudo como uma oportunidade de se aprimorar”. Além de apropriar-se de sua forma de tomar decisões, Tiago destacou também o olhar que destinam para a natureza e o sentido de igualdade no grupo como as maiores lições. Um aprendizado com a própria experiência de voluntariado é que cada minuto importa, porque é único.
Viajante do mundo
A primeira memória de Fernanda Torres Blanco (52 anos, Barcelona – ES) como voluntária vem dos seus 14 anos, quando dava aulas para crianças menores da vizinhança, de Matemática, História, Inglês e outras disciplinas. Há 28 anos no grupo Telefônica, ela participa pela primeira vez do Vacaciones Solidárias. “Este modelo é o que sempre imaginava que tinha que encontrar no Brasil. Quando você está viajando, mesmo em lugares pequenos, não é fácil ter contato com isso, uma história verdadeiramente brasileira”, define. Ela já esteve oito vezes no país, para visitar locais bastante característicos, como a Amazônia, o Pantanal, o Vale do Pati (Chapada Diamantina), Alter do Chão, sempre ficando em pousadas ou na casa dos habitantes locais. “Gosto muito de viajar e de viajar sozinha, principalmente. Neste entorno, cada pessoa se torna relevante. Chamou a sua atenção na comunidade de Ivaporunduva a sua organização de maneira horizontal em uma sociedade tão vertical como a nossa. Apesar de terem seus ‘faróis morais’, como ela definiu as lideranças locais, eles conseguem preservar a horizontalidade e um sistema de rotação de atividades. “Fiquei pensando em como isso pode estar relacionado ao seu passado cruel da escravidão”, ponderou. O que leva com ela é um sentimento de admiração pela sua humildade, liberdade e senso comunitário.
Futebolista engajado
O repertório de Luis Miguel Sternberg (32 anos, Lima – PE) como voluntário é extenso e diverso. Ele já organizou campanhas de Natal, arrecadação de fundos, doação de brinquedos, passeios ao cinema. Hoje, oferece seu tempo às crianças de um hospital e aos idosos de um asilo. Mas não foi por isso que, apesar da barreira idiomática, integrou-se tão naturalmente à comunidade de Ivaporunduva. “O futebol é um idioma universal. Se há um campo, você só precisa se aproximar, observar, e alguém vai perguntar: quer jogar?”, explica o voluntário, que todas as tardes, após o trabalho, jogou com os quilombolas. Nestes momentos, notou algumas diferenças: eles jogam descalços, porque poucos têm chuteiras, e não se topam muito, qualquer pisada, é falta. Para Luis, o que define a experiência de voluntariado é a aprendizagem de duas vias. Coisas úteis, como martelar bem e rebocar, e coisas simbólicas, como entender melhor como vivem os outros, como trabalham, quais são seus problemas. “É muito fácil submergir em nosso dia a dia na cidade e pensar que isso é o mais normal, quando não é”, destaca. “Aqui, nos damos conta que a vida tem mil maneiras de ser vivida.”
Outras formas de vida
Yamila Nayla Alvarez Helfenstein (31 anos, Buenos Aires – AR) sempre procurou fazer algo além de atingir suas próprias metas. Ser voluntário, em sua opinião, não requer necessariamente doar as férias para atender a uma demanda específica, que pode parecer um investimento muito grande para alguns, mas dedicar um pouco do seu tempo a cada pessoa. “Um simples olhar para o outro faz diferença”, explica. “Não é o caso de sair fazendo coisas. É não ser indiferente. É conscientizar-se, pensar no outro, empatizar, e o resto acontece naturalmente.” A chance de vir ao quilombo não surgiu imediatamente. Jamila já tinha se inscrito outras vezes, desde que soube do Vacaciones. Mas foi chamada em um momento oportuno: acabou de terminar a faculdade e trocar de área na empresa. “Me senti privilegiada!”, compartilha. O que mais chamou a sua atenção foi a forma de vida dos comunitários. “Na sociedade em que vivemos, as pessoas querem crescer aqui e ali e para isso abrem mão dos seus valores. Por isso há tantos ricos e pobres. Para eles, é mais importante manter-se unidos e assegurar que todos estejam bem”, observa. Um exemplo claro disso é a forma como tratam a educação dos jovens, que são apoiados por todos para fazer faculdade fora, e depois voltam – e voltam porque têm valores e vivem como uma comunidade.
Noites caipiras
Vanessa Alencar de Araújo Silva (23 anos, Rio Branco – AC) reconheceu, ao chegar no quilombo, elementos da sua própria infância. Na cidade de Cruzeiro do Sul, a 650 quilômetros da capital do Acre, ela vivia em contato com a natureza, jogava bola na rua, pescava, brincava muito com seus quatro irmãos no sítio da família. “Meus pais me ensinaram o verdadeiro valor da vida”, reflete ela, que é filha de professores. “Em Cruzeiro, as pessoas são muito simples, falam com todo mundo. Aqui parece muito com o pessoal de lá. Não existe ‘ah, eu sou melhor que você’. Essa é uma coisa que carrego dentro de mim e que não quero perder jamais, os meus valores.” A voluntária, que também é música e cantora autodidata, surpreendeu a todos quando lhe deram um violão na mão. Embalados pela moda de viola e pela fogueira, voluntários e quilombolas tocaram e cantaram juntos, noites a fio. Uma situação que para ela marcou a experiência do Vacaciones foi quando fez um sapo de origami para um menino quilombola e ele o guardou com o maior carinho. “Ele chamou uma amiga e várias outras crianças para ganharem origamis também. Ofereci um gesto simples, que fez parte da minha infância, e eles interagiram como se fosse algo extraordinário. É incrível.”
O samba do voluntário
Desde que entrou na empresa, há 3 anos, Joyce Pereira Tarquino (29 anos, São Paulo – SP) começou a procurar ações de voluntariado, como o Dia dos Voluntários e o Vacaciones Solidarias, para participar. “É uma tradição familiar”, explica ela, que desde os 6 anos acompanha os pais em todos os setores da Escola de Samba Rosas de Ouro, inclusive o social. Aos 22, levantou um projeto para melhorar, através do samba, a autoestima das mulheres da comunidade atendida pela escola, na Zona Norte de São Paulo. No início, a proposta era realizar seu sonho de serem passistas, para depois transformar toda a sua vida. “Muitas estavam saindo da escola por falta de oportunidade de desfilar e, sem ter para onde ir, entravam no mundo das drogas ou tomavam outros rumos que não desejavam realmente.” A experiência de voluntariado no quilombo trouxe alguns aprendizados. “Chegamos com sede de mudar tudo, mas vimos que não é bem assim. Aqui, é preciso cuidado; tudo precisa ser refletido, como explicou Ditão em nossa reunião na igreja”, esclarece. Para ela, a troca foi muito rica e a fez refletir sobre a forma como trabalha em todos os seus projetos.