Nesta terça-feira (16/09), o Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) divulgou a nova edição da Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias de Informação e Comunicação nas Escolas Brasileiras – TIC Educação, com resultados referentes a 2024.
A pesquisa tem como objetivo investigar o acesso, o uso e a apropriação de tecnologias digitais em escolas públicas e privadas brasileiras que ofereçam Ensino Fundamental e Médio.
Ao todo, foram realizadas 10.756 entrevistas¹, entre agosto de 2024 e março de 2025, contemplando 7.476 alunos, 1.462 professores, 954 escolas/gestores e 864 coordenadores.
Conectividade
Com relação à conectividade e ao uso de tecnologias digitais, o estudo aponta estabilidade no percentual de escolas com acesso à internet para uso dos alunos, que permaneceu em 80% entre 2022 e 2024, após um ligeiro avanço em 2023, quando atingiu 81%. Como pode ser observado nos gráficos abaixo, a evolução foi positiva nas redes públicas, embora os resultados das redes municipais permaneçam em patamares mais baixos que a média nacional.
Os dados também revelam uma diferença bastante considerável entre escolas das zonas rurais e urbanas. Nesse contexto, vale considerar o Medidor de Conectividade na Educação como ferramenta complementar para avaliar não apenas o acesso, mas também a qualidade da internet disponível nas escolas, especialmente em territórios com desafios maiores de infraestrutura.

A pesquisa TIC Educação também investiga os tipos de uso que os estudantes fazem da internet no contexto escolar. O gráfico abaixo ilustra que mais da metade dos alunos das escolas que disponibilizam internet para uso em sala de aula acessam esse recurso para fazer pesquisas, lições ou exercícios solicitados pelos professores.

Uso de celulares no ambiente escolar
A pesquisa também abordou as medidas adotadas pelas escolas em relação ao uso de telefone celular pelos alunos. Os resultados revelam que houve um aumento significativo de instituições em que os estudantes não podem utilizar os aparelhos
Esse movimento, contudo, não se distribui de forma homogênea entre as redes de ensino: nas escolas estaduais, em que se concentra a maior parte do Ensino Médio, observa-se um padrão distinto em comparação às municipais e particulares. Essa diferenciação sugere que parte das variações encontradas pode estar associada à etapa de ensino.

É interessante observar que esse movimento ocorre em paralelo a estudos que começam a investigar os efeitos concretos dessa medida sobre o desempenho escolar. Um exemplo recente é o estudo² conduzido pela Universidade de Stanford em parceria com a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, que analisou o impacto da proibição do uso de celulares nas escolas da rede pública. Os resultados apontaram uma melhora expressiva de 25,7% no desempenho em Matemática³ entre 2022 e 2024.
Embora os dados indiquem benefícios associados à restrição do uso de celulares, é importante que o debate não se limite a uma dicotomia entre proibição total e liberação irrestrita. Os resultados do PISA 2022⁴, por exemplo, mostram que o impacto da tecnologia na performance dos estudantes varia conforme a forma como os dispositivos eletrônicos são incorporados à rotina escolar.
Segundo o relatório da OCDE, 30% dos estudantes nos países-membros e 45% dos brasileiros que utilizavam equipamentos digitais por até uma hora diária em atividades de aprendizagem apresentaram, em média, um desempenho 25 pontos superior em matemática em comparação àqueles que não faziam uso desses recursos.
Esses dados reforçam que o celular pode ser um aliado valioso no processo de ensino e aprendizagem, desde que seu uso esteja vinculado a objetivos pedagógicos bem definidos e seja orientado pelos professores. Por isso, é fundamental que os docentes recebam formação em competências digitais, para que possam integrar a tecnologia como uma aliada ao processo de ensino e aprendizagem.
Competências digitais para docentes
A pesquisa TIC Educação aponta também que há amplo espaço para o desenvolvimento dessas competências: 30% dos professores entrevistados relatam que têm dúvidas sobre como aplicar recursos digitais de forma pedagógica, enquanto 36% relatam que o uso de tecnologias nas atividades com os alunos demanda muito tempo de planejamento.
Outro dado que evidencia a necessidade de fortalecer a formação dos professores em competências digitais é que apenas 54% dos docentes participaram de algum tipo de formação continuada voltada ao uso de tecnologias nos processos de ensino e aprendizagem nos meses anteriores à realização da pesquisa. Ou seja, quase metade dos professores ainda não teve acesso a capacitações recentes sobre o tema.

Novas tecnologias na educação
Essa necessidade de formação se torna ainda mais evidente diante da incorporação de ferramentas mais avançadas no cotidiano escolar, como a Inteligência Artificial (IA). Segundo a pesquisa, menos da metade dos professores (43%) utiliza IA generativa na preparação de atividades.

É válido ressaltar também que, entre aqueles que fazem uso de plataformas educacionais, 78% recorrem à IA para gerar questões, exercícios e provas. Esses dados mostram que, embora a IA já esteja presente em parte das práticas docentes, seu uso ainda é limitado.
A concentração em tarefas avaliativas sugere que há um potencial não explorado de aplicação dessas tecnologias em outras dimensões pedagógicas, como apoio à personalização da aprendizagem ou na elaboração de planos de aula. Esse dado reforça, portanto, a importância de capacitar os professores para que possam explorar todo o potencial dessas tecnologias de forma crítica e alinhada aos objetivos pedagógicos.

Essa lacuna na formação docente também se reflete nas informações que os alunos recebem sobre o mundo digital. Chama a atenção, na tabela apresentada abaixo, que um percentual relevante de alunos ainda não recebem orientações de seus professores sobre ‘verificação de informações e fontes de referência’ e ‘privacidade e proteção de dados pessoais na internet’.
É importante reforçar que os temas indicados na tabela abaixo estão todos relacionados às competências associadas ao pensamento crítico, à segurança e ao uso ético das tecnologias, previstas na BNCC Computação.
No entanto, embora o Conselho Nacional de Educação (CNE) tenha estabelecido que sua implementação deveria iniciar em 2024, com prazo de transição até 2026, os dados mostram que ainda há uma distância considerável entre essas diretrizes curriculares e a realidade das escolas. Esse descompasso evidencia a urgência de desenvolver e aplicar estratégias concretas que assegurem a efetiva priorização desses temas no ambiente escolar.

Também é interessante observar que há espaço para fortalecer o papel dos gestores escolares na integração das tecnologias digitais. A pesquisa TIC Educação mostra que 68% dos gestores se reuniram com professores e outros profissionais da escola, nos 12 meses anteriores à coleta dos dados, para discutir o uso de tecnologias no ambiente escolar.
Esse número indica que uma parcela significativa das escolas já promove algum nível de articulação interna sobre o tema, mas também revela que cerca de um terço das instituições ainda não realiza esse tipo de diálogo, o que pode limitar o alinhamento entre gestão, prática pedagógica e uso estratégico da tecnologia.

Insumos valiosos para profissionais da educação e formuladores de políticas públicas
A edição 2024 da pesquisa TIC Educação reafirma seu papel como uma fonte robusta para compreender os múltiplos aspectos da integração das tecnologias digitais no contexto escolar brasileiro. Com dados desagregados, o estudo oferece uma excelente radiografia das condições de acesso, uso e apropriação das tecnologias nas escolas de Ensino Fundamental e Médio
Os resultados evidenciam avanços importantes, mas também revelam lacunas persistentes, especialmente no que diz respeito à formação docente, à mediação pedagógica e à equidade entre redes e territórios.
Assim, a pesquisa se consolida como um insumo estratégico para profissionais da educação, gestores escolares e formuladores de políticas públicas. Ao permitir a identificação de boas práticas, desafios e oportunidades, ela contribui diretamente para o desenho de ações mais eficazes, contextualizadas e inclusivas.
¹ Metodologia de coleta: CAPI (Computer-Assisted Personal Interviewing), técnica de pesquisa presencial em que o entrevistador utiliza dispositivos eletrônicos para aplicar o questionário diretamente ao entrevistado. Ela combina o contato humano do face a face com a eficiência da tecnologia.
² Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/sudeste/rj/rio-estudo-aponta-melhora-no-aprendizado-escolar-apos-proibicao-de-celular/. Acesso em 03/09/2025.
³ Baseado nas notas de testes padronizados bimestrais de Português e Matemática, elaboradas e corrigidos pelo CAEd.
⁴ Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE). PISA 2022 Results Learning During – and From – Disruption Volume II. OECD Publishing, Paris, 2023.