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19.05.2016
Tempo de leitura: 6 minutos

“A primeira inovação em currículo está em trazer os estudantes para o centro do debate”

Para Ítalo Dutra, diretor de Currículos e Educação Integral do MEC, a Base Nacional Comum Curricular por si só não produz inovação.

Para Ítalo Dutra, diretor de Currículos e Educação Integral do MEC, a Base Nacional Comum Curricular por si só não produz inovação.

Tradicional versus contemporâneo. Hierarquia versus autonomia. Competências básicas versus competências do século XXI. Ciências exatas versus ciências humanas. Formal versus não formal. Quantas vezes o avanço nas questões da educação – o que, vale notar, não é exclusividade da área – torna-se impossível pela criação de antagonismos sobre conceitos nem ao menos pactuados antes? Ou então pela atenção a minudências que desviam o foco de um objetivo global?

Com o debate nacional sobre as possibilidades de integrar inovação ao currículo, levantado em face da criação de uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC), não é diferente. Para que a educação pública dê um salto rumo à pluralidade e integralidade, será preciso superar algumas oposições e desfazer resistências.

“Na medida em que representa o país pensando no que as crianças precisam saber e desenvolver, o debate nacional em torno do currículo é muito importante”, ressalta a socióloga Helena Singer, coordenadora do departamento de Ações Estratégicas e Inovação do Sesc. Ela expõe, porém, a necessidade de se continuar permitindo que as escolas encontrem caminhos diversos para garantir as aprendizagens.

“É uma matemática difícil conciliar inovação e uma estrutura que fragmenta o conhecimento em disciplinas e séries”, alerta. “Corre-se o risco de que secretarias de educação, focadas em apoiar uma maioria de professores que solicita uma orientação mais diretiva, acabem reprimindo escolas que encontram outras formas de garantir a aprendizagem, formas mais interdisciplinares, que considerem a diversidade de formas de aprender ao longo de períodos mais longos”, explica Helena.

Na visão do diretor de Currículos e Educação Integral do Ministério da Educação (MEC), Ítalo Dutra, este é um ponto de conflito imediato ao se criar uma norma, que por sua natureza já faz uma regulação. A seu ver, o que não se pode deixar de assegurar é autonomia para que, diante das normas, permita-se algo particular. Até porque um documento prescritivo por si só não produz inovação.

Saiba mais sobre o processo de elaboração da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) nas reportagens do Centro de Referências em Educação Integral.

“Quem faz inovação são as pessoas, é a rede, é a unidade educacional”, ressalta Dutra. E a proposta da Base é ser mais uma referência, e não a única. Cabe às escolas “interpretar, articular e produzir ações que transformem esse documento, somado a outros, em um currículo de inovação”.

Um aspecto fundamental da Base, cuja segunda versão – após inúmeras consultas públicas – foi enviada ao Conselho Nacional de Educação, com muitas alterações no sentido de contemplar uma formação humana integral na educação básica, está em trazer as necessidades dos estudantes para o centro do debate. “Esta é a sua primeiríssima inovação”, afirma Ítalo Dutra.

A construção coletiva – evidente na elaboração da segunda versão – e seu caráter provisório também são enfatizados pelo diretor de Currículos do MEC como características positivas da Base atual. “Ela tem sido pensada para ser ajustada na medida de sua implantação”, esclarece Dutra.

Para garantir coerência ao documento, a versão será agora discutida e aperfeiçoada. Segundo Ítalo, o foco é pensar “como esses princípios e objetivos que configuram a base podem ser reinterpretados com foco no sujeito”. E ainda sobre a contribuição que cada área do conhecimento (Ciências Humanas, Educação Infantil, Matemática, Linguagens e Ciências da Natureza) pode trazer para a formação plena do estudante.

“Ainda é extremamente inovador escutar os estudantes”, argumenta Denis Plapler, criador do Portal do Educador e consultor da UNESCO para o MEC (Ministério da Educação), designado para documentar as práticas do Mapa de Inovação e Criatividade na Educação Básica. Em sua opinião, se a educação estiver vinculada ao desejo do aluno, acaba adentrando todas as áreas do conhecimento.

“O medo de que não aprendam ao serem escutados é um medo do desconhecido. Pois é justamente aí que começam a aprender”, sustenta. A seu ver, o compromisso da educação com as novas gerações é não ter medo de buscar o novo.

O papel da plataforma – que reúne 178 escolas inovadoras – é mostrar que não existe um padrão ou um modelo a ser seguido. “É uma luta para que não haja uma homogeneização. O que se tem ali são diferentes formas de organizações escolares e não-escolares buscando uma educação de qualidade”, argumenta.

Ao considerar as cinco dimensões estruturantes da escola – gestão, currículo, ambiente, método e articulação – o mapeamento feito pelo MEC contribui também para a criação de novos indicadores de qualidade.  “Todo mundo sabe que a avaliação externa, baseada em provas, mede uma parte muito pequeninha da educação e que seus resultados vem sendo considerados apenas porque faltam outros indicadores, mas não porque alguém acredite que estes sejam suficientes”, afirma Helena Singer.

O próprio conceito de inovação, como declarou Denis Plapler, envolve repensar os objetivos da avaliação. “Com respeito às suas conquistas, escola precisa romper com estruturas rígidas, como divisão por idade, currículo orientado por disciplinas e avaliações para aprovar, reprovar ou classificar”, defende o consultor. Seria o caso de se aproximar de uma educação por valores e pela experiência, com vistas à noção da “vida como currículo”.

Na visão de Helena, é disso que se trata: a partir das referências, criar um plano de trabalho que dê conta de acabar com as diferenças inclusive entre educação formal e não-formal. “É a educação ao longo da vida, no território onde se está inserido. A escola cumpre uma parte desse papel e outras instituições cumprem outros, mas todas trabalhando em parceria, em complementaridade, articuladas por um único objetivo”, conclui. E este – a não perder de vista – está em usar essas experiências para reduzir as desigualdades e transformar a educação no país.


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