ECA: ARTIGO 13 / LIVRO 1 – TEMA: CONSELHO TUTELAR
Comentário de Haim Grünspun
Psiquiatra/São Paulo
O Estatuto da Criança e do Adolescente inova em duas situações importantes: 1) considera maus-tratos como problema de saúde, inserindo-os no capítulo “Do direito à vida e à saúde”; 2) comunica obrigatoriamente o caso ao Conselho Tutelar, órgão eleito pela comunidade local e por ela respeitado, que toma as iniciativas cabíveis, requisitando os serviços necessários para a suspeita ou confirmação de maus-tratos.
O problema não se torna, assim, de imediato, um fato policial, como acontece na maioria dos países com legislação a respeito, e não surgem consequências irreversíveis pela rigidez de leis judiciárias que cuidam do assunto.
Tomam-se providências de acordo com as condições de saúde física e psicológica, zelando, assim, melhor pelos direitos da criança.
Os maus-tratos podem ser físicos, abusos sexuais, emocionais e intoxicações propositais, que ocorrem na família, em instituições e na comunidade local.
Podem ser por ação ou omissão, e, nesses casos, se caracterizam como negligência.
Os procedimentos de um Conselho Tutelar podem servir como experiência para outras localidades, mas resolvem concretamente o caso peculiar.
Nos maus-tratos físicos a regra é encontrar um ferimento corporal resultante do ato de força física de um adulto contra uma criança, por esbofetear, socar, chutar, empurrar ou derrubar, e resultam em escoriações, edemas, fraturas, queimaduras ou hemorragias. Essas lesões são diagnosticadas, na maioria das vezes, em emergências de hospitais ou centros de saúde, ou podem levantar a suspeita de maus-tratos e devem ser comunicadas obrigatoriamente ao Conselho Tutelar.
Mesmo na confirmação de maus-tratos, os adultos, especialmente os pais, podem se defender usando o argumento de que estavam castigando, como ato de disciplina.
Sabemos que há diferenças culturais na aplicação de castigos físicos; os representantes da comunidade, para decidir, têm a seu favor a possibilidade de observar a freqüência dos maus-tratos físicos, o horário em que acontecem e o estado de consciência dos pais no momento em que infligem maus-tratos, e, assim, conseguir a confirmação de uma suspeita para, só então, tomar outras providências legais.
O uso de qualquer instrumento na aplicação de maus-tratos físicos conduz à confirmação, e não mais suspeita.
Quando maus-tratos acontecem na escola, são confirmação, pois nossa sociedade não admite castigos físicos na escola, como em outras sociedades, que até pedem para aquela castigar fisicamente os filhos.
O mesmo raciocínio pode ser feito quando acontecem maus-tratos em outras instituições, como hospitais, escolas especiais para casos crônicos ou centros de educação especial para infratores.
Na suspeita de maus-tratos, o Conselho Tutelar pode atender e aconselhar pais ou responsáveis. Nos casos de confirmação, providências legais devem ser tomadas.
O abuso sexual é um dos maus-tratos de séria gravidade para uma criança ou adolescente e as penas, nesses casos, são severas. Às vezes a situação é intrafamiliar e as decisões são complexas. Considera-se na literatura universal que a diferença de idade do autor para a vítima deve ser acima de 4 anos e a tendência é para se considerar abuso do autor a partir dos 12 anos de idade.
A confirmação, na maioria dos casos, é feita por exame especial hospitalar ou médico privado. Psicólogos e até sacerdotes podem colaborar.
Quando acontece na família, surgem várias complicações. A criança ou adolescente vítima pode, p. ex., fazer a denúncia como vingança e o fato não ser verídico. Como as providências iniciais são feitas pelo Conselho Tutelar, podemos evitar traumas familiares futuros.
Nos abusos sexuais, mesmo quando se chega à confirmação, o Conselho Tutelar poderá tomar decisões de afastamento temporário do autor ou vítima, para providências terapêuticas, não causando desorganização familiar irreversível, como em muitos países está acontecendo, pela rigidez da legislação a respeito.
Os maus-tratos emocionais pertencem mais à categoria de omissão e correspondem a situações crônicas no relacionamento entre adultos, crianças e adolescentes. Ignorar, rejeitar, aterrorizar, isolar, negar bem-estar de que os outros familiares usufruem são as atitudes mais freqüentes. São considerados como falhas não orgânicas que impedem o progresso no desenvolvimento da criança ou adolescente. Podem ser familiares ou institucionais, como na escola, p.ex.
Os maus-tratos por intoxicação podem ser na família, como alcoolização de crianças pequenas para não importunar os pais. Podem, também, ser comunitários, forçando ingestão de substâncias tóxicas em rituais nessa comunidade.
Sabemos que as vítimas de maus-tratos apresentam prejuízos que podem perdurar para a vida. Nem o perdão confesso da vítima, para pais ou outros adultos, deve modificar decisões do Conselho Tutelar ou outras providências legais.
A intervenção terapêutica que se faz necessária nos casos de maus-tratos pode ser traumática para autores e vítimas, mas é inevitável. O Conselho Tutelar realiza-a nos casos em que um dos pais é patológico, resultando no afastamento dos pais ou dos filhos para novos ambientes. A melhor iniciativa da comunidade é a prevenção. Grandes campanhas são feitas nos meios de comunicações. Podem ser úteis, mas não diminuem os maus-tratos nos países desenvolvidos e muito ricos, que fazem continuamente essa profilaxia. A intervenção por representantes da comunidade, como é o Conselho Tutelar, é uma das formas de prevenção eficaz e a publicidade sobre seus atos deve superar em quantidade as informações sobre desastres e violências.
Este texto faz parte do livro Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, coordenado por Munir Cury
ARTIGO 13/LIVRO 1 – TEMA: CONSELHO TUTELAR
Comentário de Sueli Roriz Moreira
Associação Brasileira de Proteção à Infância – ABRAPI/Rio de Janeiro
A não comunicação dos casos a que se refere esse artigo, quando detectados em hospitais, implica infrações administrativas.
As penas previstas estão no art. 245 do ECA.
A comunicação deverá ser feita às autoridades competentes (arts. 146, 147 e 262 do ECA).
Este texto faz parte do livro Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, coordenado por Munir Cury
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